O Transtorno do Espectro Autista (TEA) caracteriza-se por desafios nas áreas de comunicação social e comportamento, mas não existe, atualmente, nenhum fármaco capaz de “curar” o autismo ou reverter seus traços centrais. No entanto, uma parcela significativa de pessoas autistas apresenta comorbidades (como irritabilidade, agressividade, ansiedade, déficit de atenção e problemas de sono), para as quais a terapia medicamentosa correta, associada a intervenções comportamentais e psicossociais, pode reduzir sintomas, melhorar a qualidade de vida e favorecer o desenvolvimento.
1. Medicamentos para manejo de irritabilidade e comportamento‐desafiador
• Antipsicóticos atípicos
– Risperidona: única medicação aprovada pela FDA (EUA) para irritabilidade em crianças e adolescentes com TEA. Mostra eficácia em diminuir agressividade, birras e comportamentos auto-lesivos.
– Aripiprazol: também aprovado para irritabilidade associada ao autismo; tende a provocar menos ganho de peso que a risperidona, mas pode causar sonolência e fenômenos extrapiramidais leves.
• Considerações de uso
– Avaliar risco-benefício, monitorar peso, glicemia, perfil lipídico e efeitos extrapiramidais.
– Iniciar em doses baixas, escalonar lentamente conforme resposta clínica e tolerabilidade.
2. Medicamentos para déficit de atenção e hiperatividade
• Psicoestimulantes
– Metilfenidato e anfetaminas: podem melhorar a atenção e reduzir a impulsividade; entretanto, uma fração de indivíduos autistas demonstra menor tolerabilidade (irritabilidade, prejuízo do sono, rebote).
• Não estimulantes
– Atomoxetina: inibe a recaptação de noradrenalina; boa opção quando há intolerância a psicoestimulantes ou risco de abuso; eficácia moderada no TEA+TDAH.
– Guanfacina e clonidina (agonistas alfa-2): reduzem hiperatividade, impulsividade e ajudam no controle de irritabilidade leve a moderada. São particularmente úteis quando há distúrbios de sono associados.
3. Medicamentos para ansiedade e transtornos do humor
• Inibidores seletivos de recaptação de serotonina (ISRS)
– Sertralina, fluoxetina, citalopram: podem ajudar em casos de ansiedade, sintomas obsessivocompulsivos leves e depressão. Efeitos colaterais incluem náuseas, agitação e, raramente, ativação psicomotora.
– Observação: não há evidência robusta de que SSRI cure sintomas centrais do autismo; indicam-se quando prevalece um quadro ansioso ou depressivo com prejuízo funcional.
• Buspirona
– Ansiolítico não sedativo, com menos risco de dependência; uso adjuvante em casos de ansiedade moderada.
4. Controle de distúrbios do sono
• Melatonina
– Amplamente utilizada para regular o ciclo sono-vigília; costuma ser bem tolerada.
– Doses típicas: 1–5 mg, 30 minutos antes de deitar.
• Antihistamínicos (ex.: difenidramina)
– Menos recomendados a longo prazo por possível sedação residual e prejuízo cognitivo.
5. Antiepilépticos
• Vigabatrina, topiramato, lamotrigina
– Indicados quando há epilepsia associada ao TEA.
– Podem atuar indiretamente na regulação comportamental, pois crises convulsivas pioram atenção e humor.
6. Considerações gerais e práticas prescricionais
• Avaliação multidisciplinar: o diagnóstico de comorbidades deve ser realizado por equipe composta por pediatra ou psiquiatra, psicólogo e, preferencialmente, terapeuta ocupacional e fonoaudiólogo.
• Individualização do tratamento: cada pessoa autista é única; fatores como idade, histórico médico, perfil de comorbidades e ambientes de suporte influenciam a escolha, dose e duração do tratamento.
• Monitoração contínua: acompanhar peso, pressão arterial, efeitos colaterais motores, função hepática e renal, além de aspectos emocionais e comportamentais, ajustando a estratégia terapêutica conforme evolução.
• Integração com terapias não-farmacológicas: intervenções comportamentais (Análise do Comportamento Aplicada, TEACCH), psicoterapia, fonoaudiologia e terapia ocupacional potencializam ganhos funcionais e sociais.
• Comunicação com a família e cuidadores: informar claramente metas de tratamento, possíveis efeitos adversos e tempo esperado para melhora (em geral, 4–8 semanas para ISRS e antipsicóticos).
Minha Conclusão Final:
Não há “medicamento do autismo” que ataque seus traços centrais; o uso de fármacos no TEA destina-se ao manejo de comorbidades — irritabilidade, agressividade, TDAH, ansiedade, distúrbios do sono, epilepsia — e deve ser sempre parte de um plano terapêutico amplo, individualizado e conduzido por equipe especializada. A adesão ao tratamento, a comunicação transparente com a família e o monitoramento rigoroso são fundamentais para otimizar resultados e garantir a segurança da pessoa autista.
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